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A Villa El Manzano, situada na cidade de Biobío, na zona central do Chile, ao sul de Santiago, possui uma população de 72 pessoas (divididas em cerca de 30 famílias). Em 2010, quando um terremoto assolou o Chile, muitas regiões do país sofreram com a falta de alimentos e água - mas não a vila.
É que, apesar do solo de El Manzano ser composto em 90% de areia vulcânica, os moradores do vilarejo conseguem cultivar verduras e frutas de todo o tipo, com hortas e pomares orgânicos, além de criar animais. A água consumida por eles vem de poços subterrâneos e algumas casas até possuem sanitários secos.
A iniciativa partiu de três irmãos agrônomos que conheceram o conceito de "Cidades em Transição" e convenceram a comunidade de participar do movimento. A iniciativa do vilarejo já mobilizou até o governo de cidades vizinhas e acolhe estudantes intercambistas de permacultura em um dos cursos de duas semanas oferecidos pela Ecoescuela.
No Brasil, o movimento de cidades em transição ainda está tomando forma, mas já possui incentivadores entusiasmados. Isabela Menezes, por exemplo, é uma das mobilizadoras da rede de Transition Twons Brasil. Para explicar como está funcionando tal modelo de comunidade no país, ela concedeu uma entrevista ao Portal Eco Desenvolvimento.
O que o modelo das cidades em transição tem de diferente de uma cidade atual?
Isabela Menezes: Uma cidade em transição é uma cidade que já está se preparando para uma vida pós-carbono, para enfrentar de uma maneira muito mais forte e consistente as mudanças climáticas e a crise do petróleo.Porque as coisas são emergentes, a gente sabe que o mundo é completamente dependente do petróleo, que absolutamente todas as cadeias produtivas usam de uma maneira muito forte esse combustível e que ele não vai durar para sempre.
Isabela Menezes: Uma cidade em transição é uma cidade que já está se preparando para uma vida pós-carbono, para enfrentar de uma maneira muito mais forte e consistente as mudanças climáticas e a crise do petróleo.Porque as coisas são emergentes, a gente sabe que o mundo é completamente dependente do petróleo, que absolutamente todas as cadeias produtivas usam de uma maneira muito forte esse combustível e que ele não vai durar para sempre.
Uma cidade em transição está fazendo essa preparação. Ela está fazendo uma visão de como ela quer ser daqui a 20 ou 30 anos, levando em conta as mudanças climáticas e o ciclo do petróleo. Ela está fazendo ações que a vão levar para uma outra vida daqui a algum tempo.
De quem parte a iniciativa de implantar esse novo modelo?
De cada um de nós. O Transition Towns nasceu na Inglaterra. Lá, as pessoas têm uma necessidade muito maior do petróleo até do que aqui no Brasil, já que o país é uma ilha e 70% da comida deles vem de fora. Então, uma pequena crise (como uma greve de combustível que eles tiveram nos anos 2000) pode deixá-los sem comida dentro das cidades.
Eles despertaram para essa necessidade, e quem faz isso são as pessoas. É assim: se eu tomo consciência dessas duas questões e eu quero uma vida diferente, eu começo a fazer essa transição agora, porque isso é uma coisa para daqui a 15, 20 ou 30 anos.
Nesse novo modelo, qual o papel do governo local?
É muito importante. Para você ter uma ideia, o governo da Escócia investiu uma fortuna no movimento, justamente por eles estarem nessa pressão dos combustíveis, sem o petróleo eles congelam e ficam com fome. Então o melhor é investir agora em alternativas e em menos dependência por parte das cidades.
O petróleo é um combustível fantástico. Nós costumamos dizer que ele é a fórmula do Asterix. É essa porção mágica que nos torna extremamente fortes. Para se ter uma ideia, um tanque de gasolina é equivalente ao trabalho de 8 mil homens, em termos de força. Dá para ter uma noção de quanto o petróleo fez a gente crescer e se desenvolver.
Já em São Paulo, por exemplo, se um caminhão de comida não puder entrar na cidade, em 72 horas não há mais nenhum alimento. É papel do governo estimular o fortalecimento local.
Qual o conceito de resiliência?
É a capacidade de um material de retornar ao seu formato original. Um elástico, por exemplo, se for esticado tem grande capacidade de voltar ao normal. Já a resiliência em uma comunidade é a capacidade dessa comunidade de se levantar após o choque, após um problema grave.
Se você comparar o furacão Katrina com a tsunami da Indonésia, o pessoal da Indonésia se levantou com muito mais rapidez do que o Estados Unidos, porque eles são uma comunidade menor, mais unida e que utilizam pouca energia do petróleo. Até hoje tem gente esperando o Extreme Make Over (programa televisivo de reformas de casas) consertar lares nos Estados Unidos.
Quais são os critérios para se tornar uma cidade em transição oficial?
Na verdade, você se torna oficial se você quiser. Essa é apenas uma metodologia que pode te ajudar a trilhar o caminho. Se você captar o espírito da coisa, pode começar um movimento de transição em sua cidade.
Agora é uma metodologia que eles implantaram é muito bacana. Começa com um grupo iniciador e vai tentando contemplar todos esses ingredientes para realmente fazer um movimento forte. Mas a maior necessidade é existir pessoas que acreditam no assunto e na proposta.
Há comunidades "oficiais" aqui no Brasil? Quais são e fase de transição elas estão?
Sim, na cidade da Serra e na Brasilândia, por exemplo. A Brasilândia foi o primeiro movimento de transição em uma comunidade de baixa renda. Ela é formada por 110 favelas reunidas na zona norte de São Paulo e é a maior favela urbana da América do Sul.
Como você vem trabalhando para ajudar a implantar o modelo nas cidades e comunidades brasileiras?
Eu vesti totalmente a camisa. Desde que eu descobri as Cidades em Transição eu me dedico bastante, participo de todos os treinamentos e sou capacitada para fazer rodas de conversas sobre o Transitions, além de ser responsável pelo site da rede brasileira. Eu dedico 70% do meu tempo a passar essa mensagem e iniciei o grupo de transição da Granja Viana.
A sua casa é uma casa em transição? Como você faz para tentar se encaixar nessa movimentação contra o aquecimento global?
Eu sou uma pessoa em transição e a minha casa é uma casa em transição. Eu fiz um plano com metas para como eu, Izabela, e a minha casa podemos ser mais resilientes e ter uma pegada ecológica menor. Então, eu comecei a fazer várias modificações, desde o básico, que é trocar suas lâmpadas por lâmpadas mais econômicas, a ter o minhocário e a composteira de folhas, horta, reciclar todo o lixo e evitar trazer saco plástico.
Eu vou andando por esse plano, porque qualquer mudança de hábito é uma coisa que é custosa, que gera muito estresse. Primeiro, eu decidi que iria parar de fazer a unha. Fazer unha toda semana é um gasto absurdo, a gente polui muito o planeta com acetona, algodão, esmaltes. Os esmaltes vêm do petróleo e são cancerígenos. Eu firmei essas ações comigo. Parei de fazer a unha e decidi que não iria mais usar tinta no cabelo.
Comecei a andar em cima das minhas metas e depois passei a fazer um plano para a minha casa. Eu, a minha casa, o meu marido e os meus vizinhos estamos todos em transição.
A primeira cidade em transição, Transition Town Totnes, organizada por um grupo liderado pelo inventor do movimento, já está na última fase do modelo...
O próprio Rob Hopkins diz que o Transition é um movimento que ainda está sendo construído, pois é um movimento muito novo. Eu não diria para você que eles já chegaram lá, mas diria que está todo mundo no caminho. Digamos que Totnes está bem avançada na história, porque eles estão fazendo isso desde o início, o criador do movimento está lá. Mas não é possível mudar assim em tão pouco tempo.
Você acha que esse modelo de vida é confiável, que é o futuro das comunidades?
Eu acredito muito no modelo do Transition e eu acho que o futuro de todo mundo é tomar pé das suas próprias decisões. A gente toma muito pouco partido, muito poucas decisões da nossa comunidade. Eu acho que é sim um possível futuro para as cidades, por meio de ecovilas urbanas e rurais, pensamento sistêmico...
A gente desaprendeu em viver em conjunto, eu mesma vivi ouvindo que "vizinho bom é aquele que você não conhece", mas isso é uma desunião que não traz benefício para ninguém. Eu realmente acredito que é um dos caminhos do futuro, não digo que é o único porque eu não acho que exista verdade absoluta, mas esse movimento fez todo o sentido para mim e para a minha vida.
É possível reconhecer o conceito de transição por meio de quatro pensamentos
- A vida com menos energia é inevitável e é melhor planejar isso do que ser pego de surpresa.
- Nós perdemos a resiliência de lidar com os choques energéticos.
- Nós precisamos agir por nós mesmos e precisamos agir agora.
- Liberando o gênio do coletivo nós podemos desenhar formas de viver que são mais enriquecedora, satisfatórias e conectadas com o presente.
Os doze passos para uma comunidade em transição
- Criar um grupo iniciador;
- Fazer eventos e sensibilização;
- Estabelecer os fundamentos desse grupo;
- Fazer um grande lançamento para esse grupo;
- Formar grupos de trabalhos;
- Usar a tecnologia do open space (que é uma tecnologia de discussão e de tomada de decisão);
- Desenvolver manifestações práticas e visíveis do seu projeto;
- Facilitar o aprendizado de habilidades;
- Criar uma ponte com o governo local, não existe um movimento que dê certo se não engajar a todos;
- Honrar os anciões (eles viveram numa época que não havia tanta demanda de petróleo);
- Criar um plano de energia dependente para a sua cidade;
- Deixe ir aonde quiser ir.
Portal EcoDesenvolvimento
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